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quarta-feira, 29 de dezembro de 2010

Amizade Colorida?



- Oi, Alice!

Reconheci a voz grossa e familiar atrás de mim e senti minha pele formigar com seu toque em meu ombro.

- Oi, Bê – eu respondi. Vir-me-ei para trás, para ver seu rosto. O Benício estava suado e ainda com a roupa do seu treino de futebol. Ele era o goleiro e por isso o suor estava misturado com terra.

Ele me deu um beijinho na bochecha e eu dei um gritinho.

- Que foi menina? – Ele perguntou confuso.

Tapei o nariz de brincadeira e respondi: - Você não estava com cheirinho de lavanda.

Ele riu e veio me dar um abraço, para me provocar.

- Paraaa! – gritei, entrando na brincadeira – Vá para o vestiário e tome uma chuveirada, pelo amor de Deus! Eu juro que te espero aqui mesmo.

Ele riu e correu para o vestiário junto com os outros garotos do time da escola. Eu continuei sentada na arquibancada lendo minha revista.

O Benício era o meu melhor amigo, mas eu queria que ele fosse mais do que isso. Ele se mudara para a casa ao lado há dois anos e desde então viramos amigos. Amigos mesmo do tipo que conta tudo um para o outro. Ele me contava das garotas que ele ficava e eu fingia ficar feliz por ele. Eu também contava para ele dos meus “rolos” e ele ficava feliz por mim. Ele não parecia fingir como eu fazia. Eu o amava em segredo, porque somente ele sabia dos meus segredos e já que ele não sabia desse, logicamente, ninguém sabia também.

Depois de 10 ou 15 minutos ele voltou limpo e cheiroso. Com cheiro de lavanda. Provavelmente, o perfume que eu dei para ele de aniversário e ele usava para me agradar, já que era meu cheiro preferido.

- Pronto, agora estou apresentável! – Benício disse, rindo, quando chegou à arquibancada – Agora eu posso te abraçar direito?

Eu sorri. Nossa, eu adoro esse garoto.

Abraçamos-nos apertado, como sempre fazíamos, e então ele disse: - Sabe com quem eu encontrei hoje? Com a Júlia.

Júlia era a ex dele. Nossa, eu odeio esse garoto. A Júlia era uma vadia, mas pelo menos foi alguma coisa dele. Eu continuava a amiga-irmã...

Pigarreei.

- E então? Ela falou com você?

- Que nada! Ela estava com o Marcelo – ele pronunciou o nome do garoto com nojo. Isso me machucou por dentro. Ele ainda gosta da Júlia. – Mas não me importo mais, sabe Alice, se ela quiser ficar com o Marcelo ou com o Douglas ou com o Sérgio ou com...

-Eu já entendi! – interrompi-o, dando um sorriso amarelo – Bê, eu já entendi. Você não se importa mais com ela e que ela pode sair com quem ela quiser.

Benício colocou o braço envolta de mim, passando pelo meu ombro.

- É por isso que eu te adoro, Alice. Só você me entende – e me deu outro beijo na bochecha, me deixando vermelha. – Vamos para casa?

- Er, vamos, claro – respondi, escondendo meu rosto.


Quando chegamos a nossas casas, nos despedimos e entramos cada um na sua.

- Mãe, cheguei! – gritei quando fechei a porta. Vi-a sentada no sofá junto com meu pai. Ambos pareciam chateados. –Mãe? Pai?

Minha mãe fungou e percebi que ela estivera chorando.

- Aconteceu alguma coisa? – perguntei, assustada. Deixei minha mochila em cima da mesa de jantar e sentei-me no sofá, junto com minha mãe.

Minha mãe se recompôs e respondeu: - Seu pai foi transferido para outro estado.

Meu mundo parou.

- O QUÊ?

- Desculpa querida. – Meu pai começou – Sei que gosta muito daqui, tem muitos amigos...

- Eu tenho uma vida aqui, pai – interrompi.

- Nós sabemos, Alice. Eu e seu pai também temos uma vida aqui. Nós nascemos e fomos criados aqui, mas seu pai precisa do emprego. Se eu não estivesse desempregada...

- Para, ok Lúcia? Não começa a se julgar de novo.

Minha mãe preferiu não responder.

Suspirei para fazer a pergunta.

- Quando a gente tem que ir?

- Próxima semana.

Senti meus olhos encherem de lágrimas. Levantei-me, pedi licença e fui correndo par ao meu quarto. Como eu ia contar para o Benício? Como eu ia deixar o Benício?

Após algumas horas deitada na minha cama pensando no que dizer, resolvi ir ver o Benício.

Dim-Don.

- Oi Alice!

- Oi Bê.

Ele me deu um beijo na bochecha. Eu não exatamente respondi ao abraço dele.

- Tudo bem com você? Você está séria.

- Benício...

- Opa! – ele me interrompeu. – É algo sério, então. Você nunca me chama de Benício. Entra.

Entramos e ele me chamou para ir para o quarto dele, o que era normal – nós dois vivíamos um no quarto do outro.

-Então, - comecei novamente – eu nem sei como dizer isto, Bê! – Eu estava começando a chorar novamente.

- Ei, ei, calma, calma – Ele me abraçou e afagou meu braço – Shh. Calma, só conta o que aconteceu.

Respirei fundo.

- Meu pai foi transferido para outro estado e vamos nos mudar próxima semana.

Ele parou de afagar meu braço.

- Oh – foi tudo que ele disse.

Sai do seu abraço. Eu passei horas pensando como ia falar e achava que já era hora de me declarar. Abri a boca para começar, mas nada saia. Benício estava olhando fixamente par ao chão. Eu comecei a ficar nervosa – minhas mãos estavam molhadas de suor, meu coração palpitava mais rápido. E eu desisti. Disse pro Benício que ia para casa começar a arrumar minhas coisas e fui embora.

Passei a semana evitando o Benício. Como tínhamos ficado de férias esta semana, não precisava o ver no colégio. Eu só ficava trancada dentro do quarto empacotando minhas coisas.

No dia em que íamos embora, não havia mais nada para empacotar e eu estava sem nada para fazer.

- Alice, você já se despediu do Benício? – perguntou minha mãe parada na porta do meu quarto.

-Não – respondi de mal humor.

Ela foi sentar-se ao meu lado no chão.

-Querida, eu sei o quanto você gosta dele – Não consegui não bufar. Ela riu – Sim, eu sei. Está escrito nos seus olhos. Eles brilham quando você fala dele.

Senti meu rosto ficar quente.

- Você já falou para ele o que você sente?

- Eu não sinto nada pelo Benicio – falei, ainda teimosa.

Minha mãe respirou fundo: - Querida...

Ela falou de um modo tão doce, tão acolhedor, tão materno...

- Tá legal, ta legal. Eu gosto dele sim. Mas, e daí? Ele não veio me procurar desde que eu contei para ele. Nem uma ligaçãozinha.

Minha mãe deu uma risadinha e eu fiquei sem entender nada.

- Na verdade, – ela falou - acho que eu e seu pai demos um pouco de culpa nisso. Percebemos o quanto você estava chateada e quando ele veio aqui, pedimos para ele deixar você pensar um pouco. Acho que ele levou meu pedido a sério demais.

- Mãe!

- Querida, calma. Ainda temos tempo. Por que você não vai até a casa dele e não bota fora tudo que está entalado, hein?

Encorajada, levantei-me e corri para a casa do Benício, antes que mudasse de ideia.

"Você nunca sabe que resultados virão da sua ação. Mas se você não fizer nada, não existirão resultados."

Toquei a campainha. Quem atendeu foi a mãe dele. Ela me disse que ele estava no quarto e eu subi. Benício estava no computador.

- Alice? - falou ele quando me viu, com um olhar confuso e de saudades.

- Bê, sei que devo estar falando muito tarde, mas, como dizem, antes tarde do que nunca – eu dei uma risada nervosa e quando vi que ele estava ainda mais confuso, continuei – Benício, desde dia que eu te conheci você foi meu sol, quem iluminava meu dia. Mas não no sentido de amigos. Bê, eu te amo e sempre amei. Eu sei que você só me vê como sua amiga-irmã, mas meu sonho é ser mais que isso e... – lágrimas começaram a cair.

Ele levantou da cadeira e veio até onde eu estava. Ele somente me abraçou.

- Alice, eu não sabia que você se sentia assim, eu... não sei o que dizer...

- Que tal dizer que sente o mesmo? – Arrisquei nervosa.

Ele parecia nervoso.

- A Júlia e eu voltamos – ele atirou as palavras em mim, e doeram mais do que se ele tivesse atirado em mim.

Afastei-me do abraço. Olhei bem para ele. Ele parecia estar com dor por ter me machucado.

- Desculpa – ele sussurrou.

Mais lágrimas caíram dos meus olhos, mas agora de tristeza. Eu não sabia para onde olhar.

- Alice – ele tentou falar e me abraçar, mas eu me afastei dele.

Enxuguei as lágrimas com as mãos e disse: - Tchau, Benício. Foi bom te conhecer.

E fui embora para o novo futuro que me esperava.

domingo, 26 de dezembro de 2010

Coração Angelical



- Para com isso, Eduardo! – gritei, finalmente. Uma lágrima caiu do seu olho, agora, azul céu.

Eu queria poder falar alguma coisa, algo para confortá-lo pelo meu grito; mas agora, quem precisava se confortada era eu. Eu, eu que acabei de descobrir o que eu descobri. Continuei olhando para ele, tentando fazer um olhar confortador, tentando abranger a mim e a ele. Lágrimas continuavam a sair dos meus olhos, borrando minha maquiagem, que Lauren demorara tanto para deixar tudo em mim perfeito.

Quando finalmente ia pedir desculpas pelo meu momento, uma luz branca e forte surgiu dentro dele e num momento ele estava ali, no outro não estava mais.

A luz havia saído do seu coração.

- Izzie, você está muito atrasada, sabia?

Sim, eu sabia que estava atrasada. Muito atrasada, na verdade. Mas não queria admitir isso para a Sueli, a inspetora mais carrasco do meu colégio. Ela vivia pegando no meu pé e no dos meus melhores amigos, Lauren e Ben. Ok, com o Ben era menos porque, sabe como é, ele é americano e tal, e só está aqui no Brasil à três anos. Mas enfim, não queria dizer para Sueli porque eu havia chegado no 3º horário. Não queria dizer que estava dormindo porque estava assistindo Supernatural no computador até as 4h da madrugada... Minha mãe tinha saído ontem à noite com o namorado dela e ainda não tinha voltado e como eu vou e volto do colégio à pé, ela não sabia desse meu, hm, pequeno atraso. Bem, até Sueli saber, é claro. O porteiro que me deixou entrar é gente boa e tenho certeza absoluta de que ele não contará nada a ninguém do meu atraso. Afinal, eu não gastei meu último saco de jujubas por nada.

Comecei a andar mais rápido e fingi não ter ouvido-a. Sueli apertou o passo, também, e conseguiu segurar o meu braço.

- Izobel Fernandes! Não finja que não me escutou – ela me virou, fazendo-me ficar de frente para ela. Fiz sinal de que me rendia com os braços e só depois de certificar-se que eu não iria fugir, soltou o meu braço e arqueou uma sobrancelha – Muito bem, Izobel, é a terceira vez nesta semana. Qual é a desculpa da vez? Preciso de um motivo, quando eu ligar para sua mãe... Alias, garanto que ela a-do-ra-rá mais uma ligaçãozinha minha não é? – disse, com sarcasmo correndo em sua voz.

Reprimi minha vontade de agarrá-la pelo pescoço e disse a primeira desculpa esfarrapada que me veio à mente.

- Quando eu sair de casa para vir para o colégio já atrasada, lembrei que tinha esquecido de colocar comida e água para o cachorro. Então não consegui achar a ração e demorei um tempão para achar. Tava tempo de chegar aqui no meio do segundo horário e se eu não tivesse pisado numa poça de lama. Voltei para casa, troquei de calça, de meia e tive que procurar um tênis. E, como a senhora sabe, eu venho para escola à pé, mas não é tão perto assim. Então, por isso cheguei atrasada... – Para completar, tentei forçar um sorriso inocente.

- E desde quando a senhorita tem cachorro, hein?

- Eu nunca disse que o cachorro era meu – disse, com voz de inocente, mas com um sorriso malicioso no final.

-Ah, vá para sala agora, Izobel! Depois da aula conversaremos! – ela gritou, seus olhos apertados, indicando o fim de sua paciência comigo.

Aproveitei a deixa, e sai correndo para o andar da minha sala.

Chegando lá, o professor de matemática, do terceiro horário, tinha acabado de entrar na sala.

- Que bom contarmos com sua humilde presença em nossa aula, alteza – disse ele, com o nível de sarcasmo no máximo em sua voz.

Entrei envergonhada, de cabeça baixa, e só murmurei um ‘bom-dia’ e ‘com licença’ e fui para o único lugar vago, na ultima carteira, do lado do menino ‘anti-social’ que ninguém nunca o ouvia falar, nem mesmo quando os professores perguntavam alguma coisa.

Quando passei por Lauren e Ben, dei um tímido sorriso e sussurrei que no intervalo contaria para eles o porquê do meu atraso (como se eles já não soubessem...) e fui para a carteira do fundo.

Joguei minha mochila lilás no chão e ajeitei-me em minha cadeira. Em nenhum momento, o garoto estranho tirou seus do seu exemplar j á surrado de Sussurro, da Becca Fitzpatrick. Ele também estava com fones nos ouvidos e me perguntei o que ele poderia estar ouvindo durante a aula. Não que eu achasse matemática divertida, mas quem tem esse ato de ouvir música na sala, pelo menos se preocupa em disfarçar os fones. Ele não; os fones estavam ali, para quem quisesse ver.

Continuei olhando bem para ele e percebi que no fone estava desenhado – à estilete, provavelmente – uma asa de anjo. A asa de anjo desenhada mais real e bem feita que eu já tinha visto. Acho que se eu tocasse poderia sentir as penas fazendo cócegas em meus dedos. Parecia tão real, tão pequena, que poderia passar por despercebido.

Será que ele é gay?, perguntei para mim mesma.

Então, do nada, ele começou a rir baixinho; só um sorriso na boca, chegando a seus olhos e uma fungada. Um movimento com os ombros. Não sabia o que podia ter graça – se era do livro, do que ele estava ouvido (o quer que fosse) ou algo que o professor tivesse dito.

Como ele movimentou os ombros, uma pena negra, como as do fone de ouvido só que três vezes maior, caiu de sua blusa. Meu olhar seguiu a pena e senti ele enrijecer-se, o sorriso desaparecido em segundos. Como se finalmente tivesse percebido meu olhar nele, o garoto que eu não conseguia lembrar o nome virou-se para mim, agora totalmente serio, com ar de medo. Encarou-me. Envergonhada, me ajeitei para frente, a fim de, prestar atenção na aula – ou olhar o garoto estranho pelo canto do olho.

Ele continuou a me olhar fixamente, mesmo quando o professor Daniel, sem esperança, o chamou, revelando-me, finalmente, seu nome: - Eduardo? Poderia, por favor, dar o raro ar de sua graça, respondendo essa questão? – disse, com sarcasmo. Eduardo nunca respondia aos professores, sempre os ignorando. Por isso e por ele não ter amigos ou algo parecido, nunca ouvimos sua voz. Por isso, ninguém (nem mesmo eu, com vergonha do seu olhar fixo ainda em mim) se deu ao trabalho de olhar para ele, à espera de sua resposta. Nem o professor Daniel teve muita paciência, provavelmente já sabendo que mandar o Eduardo de novo para a coordenação não iria adiantar de muita coisa, então passou para o próximo: - Júlia?

- X= 39, por isso, Y só pode ser 15 ou -18.

Definitivamente essa voz não era a da Júlia. Era masculinizada, mas doce, uma canção aos meus ouvidos. Uma voz nunca ouvida antes.

Todos, sem exceção, olharam em sincronia para Eduardo. Eu já o olhava pelo canto do olho, antes, e vi que ele em momento algum desviou seu olhar serio de mim – ele não olhou para o caderno, nem fez nenhuma conta aparente, nem olhou para o problema no quadro.

- O quê? - perguntou Daniel, boquiaberto.

- A resposta. – Eduardo parou de me encarar e virou-se para ele, com ar de inocência – Está certa?

-Está – Daniel, assim como todos os outros, o olhava perplexos – olhares misturando espanto com estranheza.

Ele deu um pequeno sorriso – incrivelmente lindo, devo acrescentar – e voltou-se para seu livro. Ele permaneceu como sempre pelo resto das aulas que se seguiram. Percebi que ele não estava mais com os fones.

- Tem alguma coisa errada com esse garoto, o Eduardo – eu disse, que cheguei à mesa no pátio da escola em que estava Ben e Lauren, no intervalo.

- Cara, você descobriu o mundo, Iz – disse Lauren, tirando seus olhos de sua revista de fofoca.

Ben preferiu ficar de fora da conversa, concentrando-se em sua maça.

- Estou falando sério. Ele realmente tem algo de estranho. Hoje eu vi uma pena saindo da blusa dele.

- Então está querendo dizer que ele é uma galhinha disfarçada? –retrucou Lauren com sarcasmo.

- Galo – corrigiu Ben, mordiscando sua comida.

- Tanto faz.

- Tanto faz não, Lauren, o galo...

- De qualquer forma – interrompi-os – não estou querendo dizer que ele seja uma galhinha... ou um galo – corrigi-me antes que Ben pudesse fazê-lo– mas é porque ele tem esse jeito todo estranho, de não falar com ninguém, e ficar entocado no fundão, com aqueles fones de ouvido com desenho de asas tão reais...

- O que? Fones de asas? – interveio Lauren – E ele o é tipo o que, o Hermes, o deus grego? Ok, ele é tão lindo que poderia chamar ele de um ‘ deus grego’, mas não vejo o Hermes como uma figura de beleza e...

- Cala boca, Lauren! – eu e Ben falamos juntos.

- Não estou dizendo nada disso, que ele seja alguma coisa secreta, mas... – interrompi-me, olhando para frente. Lauren e Ben seguindo meu olhar – O que a Sueli está colocando no mural?

- Não sei – respondeu Ben, interessado – Vamos lá ver.

- Argh! E perdermos a mesa?

- Então fique ai, Lauren – respondi.

- Claro que sim. Prefiro minha revista à fofoca ambulante. Além do que, vocês vão me contar de qualquer jeito mesmo...

- Só por essa a gente nem devia falar o que é – Ben retrucou. Lauren respondeu dando-lhe a língua.

Rindo, Ben e eu fomos até o mural.

- Então, Izobel – falou Sueli quando chegamos – pronta para ligar para sua mãe?

- Na verdade, Susu – ela odiava quando eu a chamava desse jeito – nós viemos ver o que você colocou no mural.

- Ah! É que o diretor resolveu se inspirar nos filmes e livros americanos que vocês lêem e vai organizar um baile aqui no colégio.

- Um baile? Do tipo com par e tudo? – Perguntei.

- É, é. Isso ai mesmo. Você deve estar acostumado com esse tipo de coisa não é, Benny?

O Ben odiava quando Sueli o chamava desse jeito, mas ele deu um sorriso educado e sem graça – É, na minha antiga escola tinha isso, sim. Mas vai ser temática?

- Ah, vai ser sim. O tema ia ser os vampiros, que estavam com aquela modinha toda e tal, mas agora o que está na moda nos livros americanos de vocês são os anjos. Estão em tudo que é livro agora!

- Anjos? –perguntei – Do tipo de asas e tudo?

- Você conhece algum outro tipo de anjo? – retrucou ela.

Fiz cara feia em resposta.

- Aliás, - continuou Sueli, agora com um sorrisinho no rosto – ligarei para sua mãe após o intervalo – e virou-se para sair.

Fiz-lhe um gesto obsceno com as mãos antes de sair.

Não pretendíamos mesmo contar para Lauren o que era no mural, mas ela nos obrigou – leia-se torturou-nos com seus enjôos antes contarmos.

Quando chegamos à sala estava decidida tirar alguma informação do Eduardo. Não sei por que queria isso, mas essa curiosidade parecia uma coceira que não podia ser coçada.

Sentei no meu lugar, respirei fundo e olhei para ele. Eduardo estava lendo seu livro, interessado.

- Então, - comecei, sem graça – Eduardo, né?

Nenhuma resposta.

- Bem, sou Izobel, mas pode me chamar de Izzie.

Eu não esperava uma resposta, por isso estava decidindo entre continuar num monologo ou deixar pra lá.

- Eu sei quem você é, Izzie – respondeu, virando-se para mim com um sorrisinho de matar – literalmente.

O eu fiquei sem reação. Aposto até que fiquei vermelha. Aproveitei que o professor ainda não havia chegado para continuar a conversinha.

-Er... – tentei achar um assunto, mas ele resolveu isso, interrompendo-me.

- Soube do baile. Você vai?

- Hm, não sei. Acabar de saber sobre ele e eu ainda não arranjei um par...

Será que isso soou como uma indireta?

- Então se considere convidada.

Soou.

- Er, você está me convidando?

Imagina, Izzie, ele só está tirando onda com a sua cara.

Ou será que ele está mesmo tirando onda com a minha cara?

- Estou.

Fique sem reação. Até hoje eu (e nem ninguém, na verdade) nunca o tinha ouvido falar e agora ele está me convidando para o baile.

- Então, aceita? – ele parecia nervoso, mas ainda contido.

Ajeitei-me na cadeira, ponderando.

- Aceito – respondi com um sorriso.

Ele sorriu aquele sorriso que eu já adorava, e antes que pudesse dizer alguma coisa, o professor chegou e viramos para frente.

Entre uma aula e outra, trocávamos algumas palavras. Quando chegou horário da saída, Eduardo se despediu de mim e me deu um beijo na bochecha, o que me fez ficar sem graça. Óbvio que Lauren e Ben quiseram saber que diabos foi aquilo. Eu contei que ele havia me convidado para o baile. Ben achou estranho, mas Lauren, como sempre foi a mais escandalosa.

Sábado. Dia do baile. Claro que eu estava nervosa. Lauren ia com o Ben e marcamos para ela se arrumar aqui em casa e os quatro se encontrariam na porta do colégio.

Minha mãe me liberou do castigo só por hoje porque um garoto já havia me convidado para o baile – e eu agradecia imensamente ao Eduardo por isso. Mas ela me comprou um vestido lindíssimo – ela era cinza, curto e de seda, a parte de baixo era renda cinza em camadas, a do meio seguia a cintura como se fossem vários cintos cinza sem fivela e, finalmente, a parte do busto era como a parte de cima de um biquíni tomara-que-caia.

Lauren fez questão de me maquiar e fazer o meu cabelo. Ela fez um rabo-de-cavalo e enrolou com uma mecha do meu próprio cabelo, prendendo com um grampo meu cabelo caramelo. Em meus olhos, ela passou e esfumou sombra preta, com um toque de sombra cinza, o que combinou totalmente com meus olhos esmeralda. Eu me sentia linda.

Finalmente, minha mãe nos levou para o colégio. Quando chegamos lá, a primeira pessoa que eu vi foi o Ben. Sozinho. Quero dizer, sem o Eduardo, porque a porta da escola estava entupida de gente. Varri o espaço com os olhos à procura dele.

- Então, chegamos – disse minha mãe – Cadê seu par, querida?

-Eu não sei – respondi, aflita.

- Ele deve estar chegando. Vamos logo, Iz, antes que o Ben resolva realmente chamar a Celeste e, se ela aceitar, terei que passar o resto do baile com o Steban – pude sentir Lauren se arrepiar só de pensar nisso. Ri dela.

- Tchau, mãe.

- Tchau, filha. Me ligue quando for para te buscar.

Quando saímos do carro, Ben parecia aliviado em nos ver. Continuei procurando Eduardo e nada.

- Uau, vocês estão lindas – Ben disse.

- Obrigada, “Benzinho” – respondeu Lauren, segurando a mão dele e indo para o porta.

-Sabe, eu realmente odeio quando vocês fazem trocadilhos com meu nome.

Lauren riu. Continuei olhando para os lados, já sem esperança. Ben pareceu entender meu olhar.

- O Eduardo está aqui. Ele ficou um pouco comigo aqui. Ele parecia nervoso então foi para aquele canto. Acho que ele queria te encontrar lá...

- Ou que você não o encontrasse e desistisse – completou Lauren.

Suspirei e olhei para a direção que Ben apontou. Realmente o Eduardo estava lá. Lindo com sempre, só que de smoking. Seu cabelo preto e sedoso escorria como sempre pelo rosto, só que agora brilhava, com gel. Sua barba estava um pouco por fazer. Nunca comentamos sobre isso, mas ele devia ter uns 18 anos. O que era estranho para alguém que cursava o 2º ano do Ensino Médio.

Ele me percebeu e me chamou com os olhos. Disse à Lauren e ao Ben que os encontraria lá dentro e fui até onde Eduardo estava. Ele estava na pracinha em frente ao colégio. Os alunos começaram a entrar, restando somente alguns e outros e os seguranças da porta.

- Oi – eu disse quando cheguei à árvore em que ele estava encostado.

- Oi – ele respondeu, dando um sorriso e me dando um beijo demorado na bochecha.

-Então, hã, vamos entrar?

Ben estava certo; ele parecia mesmo nervoso.

- Izzie, eu acho que tenho uma coisa para te contar. Acho não, eu tenho algo para te contar, mas não sei se devo contar. Quer dizer, é muito cedo... ou muito tarde, na verdade. Quer dizer, você vai me achar louco. Com certeza você vai me achar muito louco, mas, olha, eu não bebo e não fumo, ok? Como se eu pudesse fazer alguma dessas coisas... Enfim você sabe disto, mas eu...

- Eduardo? – disse, me aproximando dele.

- Si-sim? – respondeu ele, claramente mais nervoso com a aproximação.

- Você é gay? – sussurrei. Senti-o dar um pulo.

- O quê? Não! Eu não sou gay, ok? O que te fez pensar nisso?

- Não sei talvez o livro, o fone de ouvido, o isolamento...

- Não, eu não sou gay, ok?

- Então porque não me prova? – sussurrei em seu ouvido.

A mão de Eduardo escorregou para a parte de baixo das minhas costas, seu rosto se aproximando mais do meu. Seus lábios incrivelmente quentes tocaram os meus, puxando- os para si. Um beijo intenso. Que se repetia. Entre um beijo e outro ele disse: - Anjo.

Parei para encará-lo.

- Oh, que doce. Você também está sendo um querido – respondi, sorrindo.

- Não! Não é isso que eu quis dizer – encarei-o sem dizer nada, séria – Calma, Izzie! Não quis dizer que você não está sendo legal, mas que eu disse o que eu sou. Eu não sou gay, sou um anjo.

- O quê? Claro que você é um anjo. Hoje todos nós somos anjos. Mas só depois de entrar no colégio e colocarmos as asinhas toscas que o diretor deve ter comprado para usarmos... – fui saindo enquanto falava, puxando ele com a mão.

Ele não saiu do lugar, ainda segurando minha mão, agora, olhando para o chão.

- Izobel, por favor. Eu estou falando a verdade. Eu realmente sou um anjo. Um anjo em missão na Terra. Proteger-te. Sou um anjo da guarda, veja só – ele deu um sorrisinho e olhou para mim – Aqueles fones... eles servem para esconder minhas asas. estranho, né? Eu não devia te falar isso. Nem deveria ter qualquer contato contigo. Mas não pude evitar. Você é linda, charmosa... Acho que poderia dizer que te amo se tivesse certeza de anjos pudessem amar.

Pude sentir meus olhos se encherem de água.

- Para com isso, Eduardo! – gritei, finalmente. Uma lágrima caiu do seu olho, agora, azul céu.

Eu queria poder falar alguma coisa, algo para confortá-lo pelo meu grito; mas agora, quem precisava se confortada era eu. Continuei olhando para ele, tentando fazer um olhar confortador, tentando abranger a mim e a ele. Lágrimas continuavam a sair dos meus olhos, borrando minha maquiagem, que Lauren demorara tanto para deixar tudo em mim perfeito.

Quando finalmente ia pedir desculpas pelo meu momento, uma luz branca e forte surgiu dentro dele e num momento ele estava ali, no outro não estava mais.

A luz havia saído do seu coração.

Fiquei paralisada onde estava por alguns minutos, sem acreditar.

- Eduardo?! EDUARDO! Ai meu Deus, cadê você? Desculpa-me, ok? Me desculpa. Mas volta aqui! Eduardo!

- Estou aqui.

A voz veio de trás de mim. Podia jurar que ele não estava ali antes.

- O que é? – agora a voz dele estava fria como a noite.

- Eduardo, me desculpe. Apenas... por favor. É... essa coisa de anjo, você ser um anjo... para mim tudo é tudo muito louco. É que, quando eu era pequena, meu pai me contava histórias sobre anjos para eu dormir. Falava-me que eu tinha um anjo da guarda – olhei mais profundamente para ele – que sempre estaria comigo, me protegendo de tudo e de todos. Ele me contava os feitos dos anjos e essas coisas – Eduardo me olhava mais interessado no que eu falava, parecendo compreender o que eu ia falar – Mas bem, agora ele está morto – eu estava segurando o choro. – Ele morreu quando eu tinha 9 anos, num acidente de carro e, cara, eu amava muito ele. Ele era minha vida. Minha mãe vivia trabalhando e era ele quem ficava comigo. E, bem, agora ele... você sabe...

Agora eu estava mesmo chorando. Eduardo me tomou nos braços e tentou me acalmar, acariciando minhas costas.

-Shhh, shhh, eu sei, eu sei...

- Sabe? – Levantei a cabeça para olhar para ele. – Sabe?

- Sei. Foi seu pai que me mandou para você – ele respondeu com um sorriso.

- O que? Sério? Jura? – Agora as lágrimas que caiam eram de felicidade.

- Sério. –Ele deu um risinho, mas depois ficou sério. – Izzie, sei que o preço da eternidade é alto, mas sei também que as coisas podem se arranjar. Veja seu pai, ele se arranjou alguém para ficar de olho no bem mais precioso dele por ele. Ok, acho que ele não esperava que esse alguém fosse se apaixonar pela jóia dele mais enfim...

Interrompi-o com um beijo.

- Desculpa pai, ma sé recíproco – sussurrei, minha cabeça deitada no peito de Eduardo.

Rimos.

- Que tal aproveitarmos do que sobrou da noite com o baile, hein? – dei uma piscadinha.

Ele riu e depois ficou sério: - Izzie, bem, será que isso que te contei... poderia ser nosso segredinho?

- Nosso segredinho – disse sorrindo e piscando o olho.